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quinta-feira, 19 de abril de 2012

Um Índio

Muito me tira do sério determinados usos da generalização "índio".

Embora entende que a generalização é também um instrumento de diálogo e que também é uma categoria nativa, usada pelos indígenas para conosco, e que eles nos vẽem como "os Brancos', a lógica comum, cotidiana, do uso da categoria não é exatamente um modelo de pensamento criador de pontes, mas de estereótipos limitadores e desumanizadores.

Um índio para a população, mídia, escolas, e se bobear até intelectuais, é um sujeito vestido com roupa de penas, que caça e pesca seu alimento e que atrapalha usinas. Um índio serve como arquétipo de fantasias infantis ou de carnaval, como imaginário pro-ecológico "abraço na lagoa", serve para delírios de socialistas utópicos, para delírio de quem pensa no não-humano, uma espécie de duende vivo e meio vermelho que tá ali pra nos salvar da brutalidade branca ocidental.

Todos esperam um índio, aquele mesmo, que descerá de uma estrela colorida, brilhante e nos dirá o óbvio. E neste meio tempo finge não ouvir o que indígenas das etnias Pataxó Hã-Hã-Hãe estão dizendo na Bahia, o  que indígenas Krahó dizem ao observar que a ampliação de estradas próximas às reservas no Tocantins, efeito indireto de Belo Monte, acabam por ampliar exploração sexual de crianças indígenas, não ouvimos as etnias Xikrin, Parakanã, Kuruaia, Assurini do Xingu, Arara do Cachoeira Seca, Araweté, Juruna do Pakisambae que se juntam para denunciar e combater a danosa construção de Belo Monte e todos os males relacionados à elas e que concorrem inclusive para levarem a cabo um profundo ataque à elas, e que pode levá-las a problemas que incluem até a extinção.

Não ouvimos os índios quando nos dizem o que estava oculto e no que era o óbvio, mas cantamos que esperamos Um Índio, que descerá de uma estrela colorida e brilhante.

Não ouvimos os índios reais, mas fantasiamos Um Índio, pintamos nossas crianças como esse índio, desumanizamos os reais os transformando em uma fantasia, que a cada dia parece que será exatamente isso, uma fantasia, pois a realidade estará extinta.

terça-feira, 17 de abril de 2012

Vamos comer Caetano?

Ouço Caetano desde sempre. Embora  me irrite por vezes suas opiniões, e as ache, em especial as sobre política e cultura, um grande mar de equívocos, suas canções tem uma presença fundamental na minha sensibilidade. O registro vocal, as questões, a própria forma de escrever as  letras, a poética, o barroco, a ironia, o riso, a dor e o lado Logunedé, tudo são elementos de proximidade.

Andava de birra com o sujeito, muita, pelas suas posições escritas em O Globo, muita birra. Ultimamente voltei a ouvi-lo como quem reencontra um velho amigo e sou surpreendido por uma entrevista dada ao jornalista Paulo Werneck, que pode ser lida aqui, onde  entre outras coisas voltamos a concordar em algumas coisas, como: "Hoje sou totalmente pela Comissão da Verdade e não acho que torturadores devam ser perdoados. Os guerrilheiros foram punidos (inclusive com tortura e morte). É enganoso equiparar os dois tipos de crime.". 

Não é preciso dizer que Luis Fernando Veríssimo já havia matado a charada que o leitor só é feliz com o colunista que concorda com ele, e vou continuar discordando do Bardo Baiano em um tanto de coisas, mas muito me deixa feliz que uma voz da qual pouco esperava ouvir coisas como esse saia um apoio explicito a uma prestação de contas pública do país com sua história.

A critica também à esquerda como por vezes comodamente uma fábrica de maniqueísmo montada na fácil ignorada básica quando o autoritarismo veste nossas roupas, que ele cita apontando para o apoio ao imperialismo Chinês no Tibet e questões da Coréia do Norte e eu aproveito para de minha parte apontar o dedão pros apoiadores dos absurdos em Belo Monte, também é outro ponto de fantástica observação, que deve sim ser elogiado.

Caetano não se tornou nenhum Lênin ou Malatesta pra mim, mas em uma ótima entrevista faz excelentes  críticas, constrói excelentes posicionamentos e se discordo dele no louvor a Mangabeira Unger tampouco vou desqualificá-lo por adotar uma vertente ideológica da qual discordo. Há um pouco de arrogância intelectual que despreza o que lhe é díspare, talvez uma versão de "Narciso acha feio o que  não lhe é espelho".



E considero um bom vento quando com toda divergência concordemos, eu e Caetano, tantos e Caetano, que precisamos sim de mais auto-crítica e passar a limpo nossa história, e que com tanta diferença possam se tocar posicionamentos que no fundo abraçam-se no humanismo.

Vamos comer Caetano? Vamos Revelarmo-nos?

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Sem Fantasia

Ontem a primeira mulher a presidir o país, chamada de "A Cara" pelos apoiadores mais ufanistas do longo governo Lula/Dilma, controlado pelo PT e pela coligação mais ampla desde a criação da torcida do Flamengo, disse que "Pessoas contrárias a hidrelétricas na Amazônia vivem 'fantasia'". Ela disse isso para defender Belo Monte, aquela mesmo, onde o povo em greve foi ameaçado, tem sido demitido, onde os índios viraram nômades nas línguas de uma claque virtual de apoio irrestrito,etc. 

No mesmo dia surge a notícia da morte de mais uma trabalhadora rural para entrar no rol dos mártires Chico Mendes, irmã Dorothy, Ze Claudio e Maria, 19 trabalhadores do MST mortos em Eldorado e reecoar nos ouvidos ogros a belíssima e triste Saga da Amazônia de Vital Farias e causando mais e mais desilusão em um mundo cada vez menos afim de algum tipo de papo, conversa e avanço. 

Sempre fantasiei muito, sempre, sempre fui utópico e sempre perdi muito mais do que venci nas lutas cotidianas, ditas políticas. E também acho que contribui com meu radicalismo agressivo, apaixonado e meio surdo pro naipe de debate político, e diria social, onde tudo se parece com discussões de colégio onde o mais macho tem a maior pica argumentativa. 

Confesso que ando cansado disso, que ando cansado de perder meu tempo criando uma rede de argumentos, linhas, versos, sons, cores, imagens e vê-las transformadas em um muro de impedimentos, em um muro de silêncio gargalhado como escárnio. Confesso que a cada vez o homem "intelectual" se parece menos com o que nasci achando que era e mais com um sujeito arrogante, grosso, tosco, tolo, burro e em geral analfabeto funcional.

Dói saber que a gente lendo pode ficar assim e dói , e isso é uma auto-crítica, perceber que minha impaciência é também uma parte disso.

Não sei não sentir, não ter raiva, não me envolver ao sangue, não ferver. Não sei não emputecer ao ver que toda a história criada, contada e argumentada pode ser apenas um alvo de uma cusparada verbal, ignorada, mijada pela arrogância de gente que por algum pedaço da História que perdi acaba de entrar num rumo de leitura do mundo que me ofende por calar o diverso e reduzi-lo a lixo. Eu, que não sei debater, prefiro ir embora, prefiro silenciar, bloquear o acesso deles a mim.E talvez me perder como arma de convencimento, mas me ganhar como leitor isolado do mundo e partilhador do que vejo, e por vezes mal e porcamente.

Acho que só sei dar aula, falar , tentar raciocinar junto. Acho que vivo sim numa fantasia onde o que eu digo pode mudar as pessoas e talvez o mundo. Acho que vivo numa fantasia onde não sei competir politicamente, sou fraco, sou um raivento tolo que ainda tenta ser humano numa disputa onde o coração foi jogado às traças.

Eu, e talvez uns outros ai que ficam se questionando como machistas quando percebem que são conservadores depois de milênios se achando a última bolacha do pacote por apoiar feminismos e a luta lgbtt, somos anacrônicos, espécimes raras e em vias de extinção. Não, não somos especiais, talvez sejamos fracos. 

Nos questionamos e urramos e doemos e somos incompetentes e temos crises e apanhamos e crescemos e temos medo de morrer e de perder o amor, não servimos. Gritamos quando todos estão frios, somos obsoletos.

Não sei ver gente sofrer e ficar calmo. Não sei ver quem oprime ou usa a opressão como arma pra seu sucesso pessoal ou de sua ideia achar graça de argumentos sobre o como foi construído sua "hegemonia", e isso nem é o problema, o problema é que não sei mais o que fazer.

Ai vemos pessoas, inclusive muitas que outrora estavam do mesmo lado, sofrendo as mesmas dores, sofrendo as pancadas das polícias nas privatizações, defendendo uma presidente que chama gente que estuda anos a questão das hidrelétricas, engenheiros, militantes, indigenistas, antropólogos, estudantes, tudo isso e a mim, de "viventes em fantasia". Da mesma forma quando você discute que o dinheiro da Televisão priorizando Flamengo e Corinthians é uma criação de desigualdade e inclusive a transmissão dos jogos a reforçam e vê seu argumento tratado de "Argumento fraco e choro porque seu time tem trauma do meu". Ou quando você fala da questão do aborto e depois de linhas e linhas lê "Você só falou do direito da mulher, mas e do feto?".

Não sei o que fazer. Não sei para onde ir além do mundo dos arquivos e jornais velhos pra falar da escravidão ou da Coluna Prestes ou da história do Futebol, me perder na academia falando do mundo que escolhi falar, da fantasia que abracei. Me declaro derrotado.

Me declaro derrotado por não saber mais falar de futebol com mais do que um circulo pequeno, porque não sei falar de política com o adverso sem enlouquecer de raiva, porque prefiro as pessoas mais simples da padaria do que os "companheiros" acadêmicos que rasgam suas cátedras ao assumir o papel do mesmo celerado a soldo de governos e partidos ou do torcedor maluco da geral perdida.

Me declaro derrotado porque me interessa menos convencer o seu Juca da Padaria a votar em A ou B ou a pensar em A ou B, do que simplesmente conviver com ele e rir dele e com ele.

Me interessa mais falar do meu futebol preferido com quem consegue ver além do gol do Deivid perdido ou da contusão do Deco do que ir pra selva dos argumentos abaixo da linha da cintura. 

Não sou durão, talvez nem seja ogro mais, talvez seja apenas um fraco, cuja sensibilidade cansou de reagir com urros e mordidas a um mundo cada vez mais imbecil. Me declaro derrotado e alheio a este mundo sem fantasia e perdido na fantasia da mulher que amo um dia me beijando quando eu passar em um concurso.

Não sei mais ver o mundo sem voar, me desculpem. Não vou fazer deste blog um lugar onde a realidade da Dilma seja a única forma possível de existência.


terça-feira, 3 de abril de 2012

Viver é muito perigoso

A insistência com Belo Monte por parte do governo Dilma/Lula (Não se podem separá-los nas cagadas se os unimos nos avanços) é o tipo de coisa que seria surpreendente se não considerássemos que as mudanças pelo que passou o PT em sua história na imersão na ordem fossem um dia concretizar mais um partido que tem contas a ajustar com suas doações de campanha. 

Existem inúmeros textos sérios a respeito de Belo Monte, alguns mais ou menos técnicos, procurei lê-los todos e confesso que assumo um viés mais próximo aos levados a cabo pelo povo do Xingu Vivo e pelo povo do Revolutas, grupo do qual participei até o fim do ano passado quando abandonei a militância político-partidária e voltei a meu antigo ninho anarquista.

Ou seja, tenho uma opinião bastante formada sobre Belo Monte e sou contrário ao empreendimento de quatro costados e para isso também concorreu o primarismo da defesa do empreendimento pelas forças  governistas, em especial pela militância oficial virtual, que me lembra milícias pagas, cujo grau de irracionalidade pra frente Brasil chegou a dizer que os índios não notavam os empreendimentos na amazônia por serem "Nômades" e que o progresso não pode parar diante do "chilique oposicionista".

Acho que não preciso mais repetir que me encontro na oposição de esquerda ao governo e por duzentos mil motivos que podem facilmente ser facilmente notados na leitura deste blog e que também procuro manter uma critica bastante dura à mesma oposição de esquerda do qual faço parte quando ela por exemplo atribui ao Governo Dilma a criação da violência contra LGBTT e mesmo uma ampliação desta, quando se sabe que as primeiras políticas sérias a respeito foram sim tomadas por este governo, inclusive as estatísticas.  

Isso não torna o Governo imune às críticas pelos não avanços e pelas opções políticas, pela  omissão diante de uma opção pela surreal politik numa aliança com o conservadorismo das cúpulas evangélicas  e apenas conservadoras, mas tem de ser contado porque não avançar é bem diferente de recuar e cheira a oportunismo o histrionismo de parte da esquerda que atribui ao governo Dilma todos os males ao mesmo tempo que só falta pedir pra trocar de povo quando lê um texto de nome "O que a esquerda deveria aprender com os evangélicos", em que o autor faz uma análise basicamente sobre o trabalho de base evangélico e que poderia ser inspirador para a retomada de um papel ativo militante de esquerda na base da sociedade, e o transforma desonestamente no endossar de alianças políticas com os conservadores chamados de "teocratas", sem nem ter o rigor necessário pra entender a diferença entre IURD e Assembléia de Deus.

Feitas as apresentações, vamos ao que inspira o texto.

Não me espanta mais o feérico estender das fronteiras da honestidade política e do estupro às próprias bandeiras feitos pelo PT, inclusive ancorado nos exemplos históricos anteriores que pairaram sobre outros partidos de esquerda que viraram mais que partidos da ordem por conveniência para serem mais ordenadores que a ordem na defesa do "progresso" ou outro slogan muleta  à mão como o "precisamos matar a fome das pessoas".  

A  migração do PT de novato na ordem pra leão de chácara cascudo não tem só 10 anos, mas vem desde a década de 1990 a partir da troca de objetivo estratégico das transformações estruturais para a defesa da reforma e da solidariedade do "outro mundo é possível" que  dudamendonciou de vez no "Se isso te ofende, você também é PT" das propagandas pré-eleitorais de 2002, quando a sensibilidade diante da pobreza era o valor a ser buscado em quem apoiava o partido e paulatinamente os laços diretos com as bandeiras históricas da esquerda foram trocados por este viés de gerencia do capital para "matar a fome das pessoas" com todo o real polítik possível e pitadas de hipocrisia. Até porque em política concreta nem sempre se faz qualquer coisa com boas intenções. Convenhamos que isso não foi um passeio de leiteiro e nem parou com o PT, basta ver a fofura do PSOL querendo, a meu ver erroneamente, fazer uma clivagem "solidária" na luta política enquanto pinheirinhos tão ai pra provar que o jogo é duro e precisa de mais que fofura.

Esse abandono da luta política mais, digamos, socialista pro "país rico é país sem pobreza" explica muita coisa e explica a defesa intransigente de todo e qualquer ato para manter os planos de "crescimento" feitos pelo governo e defendidos pelo PT e também às justificativas de enrustimento da comissão verdade, das medidas de combate à homofobia, das questões de gênero,etc, como fim de garantir apoio pro "Pra Frente Brasil". 


Sendo curto e grosso: Negozinho saiu do "Vamos mudar o mundo" pro "vamos garantir comida na mesa" e ai se estabeleceu prioridades e putz, a dimensão do voto gay e das mulheres organizadas, por exemplo, não coça a máquina a ponto do povo se tocar e desacelerar pra conversar do alto do trator.

A logica de explicação da necessidade de carro, casa, máquina de lavar e geladeira é muito mais simples de explicar pra uma população que saiu de uma merda de década de 1980 perdida, pobre, sem liberdade, fudida e mal paga, depois pros anos 1990, que não foram muito diferentes, para um período onde o estado garante um minimo de dignidade via bolsa-familia, via programas de habitação, UPPs, etc, com todos os problemas de cada um e que abordei duzentas mil vezes neste mesmo espaço.  O argumento do crescimento é tentador, o argumento da ampliação de direitos nem sempre, eles mexem com valores profundos,  construído na longa noite da história. 

Comissão verdade? putz, quantas vezes se houve que "na ditadura é que era bom" e em geral remetendo ao período de crescimento mais próximo que parte da população viu que foi o "Milagre Brasileiro"? Não são poucas e talvez seja ai o link que se faz diretamente entre o hoje e o passado e inclusive se entenda positivamente a destruição de parte da Amazônia com requintes de crueldade feita pelo empreendimento gerado na ditadura e levado a cabo pelo governo mais popular da história recente  e em período democrático: Belo Monte.

Não podemos perder de vista que os dois períodos de maior crescimento econômico na história recente do país foram justamente períodos ditatoriais e de enorme intervenção do estado na economia: Vargas e Ditadura civil-militar pós-golpe de 1964. Não podemos perder de vista que a formação do Luiz Inácio, da Dilma e de parte da ala majoritária do PT é  o desenvolvimentismo JK (Lula), Vargas (Dilma que foi do PDT de Brizola até outro dia) e a referencia ao socialismo real comunista por parte importante das lideranças, mesmo os que vieram de linhagem trotkista, ou seja, em todos os lados temos uma lógica do estado impulsionador do desenvolvimento e que perder anéis pra manter os dedos são coisas que devem ser feitas e que o importante é garantir que o estômago não ronque.

Todo o resto é desimportante, rapaziada! E ai vamos ser justos, porque mesmo nos mais ferozes grupos revolucionários temos, salvo exceções, a colocação em segundo plano tanto a luta de gênero, quanto a anti-racismo, quanto a anti-homofobia e o meio ambiente.

Por isso que apesar de lamentar profundamente ver um partido que ajudei de alguma forma a construir virar um ameaçador de trabalhadores em greve com fuzis, como relata o grande Rui Sposati no twiter e no Xingu Vivo, não me surpreende o ocorrido.

Me surpreende é o definhamento de uma oposição interna no governo e  partido e mais ainda a hipocrisia desta "oposição interna" que se mantém como endossadora indireta dessas ações e largam mão do mais básico o "instinto" político de solidariedade com o republicanismo democrático que não pode ser cúmplice da proibição de cobertura de greve por um jornalista como está sendo feito com o jornalista Rui Sposati.

Me surpreende é ainda existir dentro dos movimentos apoiadores do governo quem mantém quase um discurso polianesco de disputa de algo que me parece cada vez menos com eles.

Me surpreende é a manutenção de um discurso da oposição de esquerda ao governo que mantém uma lógica que ou é moralista, ou é anti-religiosa pagando de laica, ou é  apena histriônica e chegada aos píncaros da desonestidade oportunista se valendo dos furos do governo não para formular uma crítica consciente ao mesmo, mas pra emular elitismos e demofobia travestida de "marxismo religião é o ópio do povo" e que não faz a menor questão de esconder que usa a revolta de parte da esquerda radical com o governo pra gerar sua própria matilha na competição com a matilha progressista apoiadora do trator dilmista.

Me surpreende é que estamos diante de um quadro critico para a esquerda e quando olharmos ao redor as alternativas não diferem em essência ao que temos como hegemônico.

Diante desse quadro a única coisa que me vem é Guimarães Rosa: "viver é muito perigoso".

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Nada mais civilizado do que o genocídio

Pra escrever este texto primeiro pensei em discutir o Civilizado usando aspas, mas abri mão. Embora o civilizado tenha trazido junto consigo a espada de Cortéz e o poema de Cervantes, o uso de Civilizado com aspas para demonstrar a presença física, patente e incontestável da espada reduziria civilização apenas a seu melhor, faria análise cair por terra.

A discussão sobre o que é civilizado ou não é antiga, ouso dizer, sem o rigor acadêmico necessário, que desde que los Hermanos Gregos Platão e Aristóteles, ou mesmo antes, discutiram o que era ou deixava de ser humano. No século XIX o "Fla x Flu" entre Kultur e Civilización para definir o que era Cultura (Grosso modo uma discussão entre o arcabouço global de mitos, lendas, modos de fazer somado à língua,Kultur, e o aspecto mais focado nos usos e costumes aparentes e patentes era, civilización), também era  uma disputa pela demarcação do que era Civilização, ou do que era Humano.

Em todo este processo a civilização era o limes, era a fronteira entre o humano e o bárbaro, este que não sendo EU meu diferente, meu antípoda e, porque não, meu adverso, meu contrário.

Claro que do mesmo modo a definição do humano, do civilizado criou a definição de humanidade, de variedade, de cultura como um bem universal,  de direito como algo a ser ampliado e estendido universalmente. Dai nasceu desde a luta pela declaração universal dos direitos do homem até a moderna antropologia e a percepção do homem como mais do que o Europeu Branco, o civilizado.

O Civilizado criou desde o trem do progresso que segue em frente continente a continente levando sua marca ao todo como a resistência ao trem. E é neste contexto que novamente a civilização encosta na barbárie, que o limite entre ambos, tido como claro pelas trombetas ufanistas do "progresso", que proclamam em várias línguas a necessidade de "seguir  em frente", fica tão tênue como difuso. A Civilização é a mesma que defende os oprimidos e os queima, como fizeram com a criança indígena no Maranhão . Ao queimar o "bárbaro" , aquele pequeno ser isolado, os civilizados rompem com o que seria a clara diferença entre "nós" e "eles". 

A espada de Cortéz volta a nos lembrar que assim como o poema de Cervantes é parte do processo de avanço de uma cultura sobre as outras na voracidade da conquista, na demonstração que sem vigília o genocídio é parte intrínseca da civilização dos direitos do homem.  A barbárie então deixa de ser o contrário de civilização, sendo apenas seu braço armado.


quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

O mundo tá ficando difícil de ser encarado sóbrio


O mar não tá pra peixe, o mato não tá pra cobra.

Diante da necessidade do "desenvolvimento" ontem se aprovou um Código Florestal que é pior que o votado na câmara. Perdemos essa, Esquerda, my friend!

No dia a dia do mundo Belo Monte é discutida até na padaria agora e "precisamos de energia" é o mote, e a qualquer preso, porque é "besteira essa obsessão indígena pelo espaço sagrado". A Obsessão branca e cristã pela buceta, feto e fígado sagrado é plausível, a "obsessão indígena" é coisa de bugre.

Diante disso o combate pela democratização das comunicações, pela lei de médios ainda é uma pauta,né? Não, não é. Porque além do silencio do Governo a respeito, o que é repetido pela Imprensa governista, simbolizada no movimento dos Blogueiros Progressistas, é só uma propaganda de seminários e discussões extra-oficiais a respeito, onde aparecem aqui e ali membros do Governo pra dissolver em sua baba de lagarto as velhas platitudes nunca concretizadas a respeito dessa necessidade.

Imprensa governista? Existe? sim, claro, é uma imprensa alternativa centrada nos "progressistas' e cuja única função é repelir os ataques da "PIG" que vem a ser o "Partido da Imprensa Golpista" criado pelo mesmo Paulo Henrique Amorim que apoia Belo Monte e chama de mentiroso o movimento Xingu Vivo e a CIMI quando estas se opõem a Belo Monte.

Aliás o silencio dos Blogueiros progressistas em torno de qualquer medida de recuo conservador do Governo do qual dependem é sintomático. Procurem Belo Monte, Código Florestal, Kit-Antihomofobia, PLC 122, alguma coisa dessas nos principais membros do movimento e você vai encontrar um nada absoluto.  Nem pra bater nas inverdades, putarias, canalhagens de Veja a respeito. Aliás, a Veja anda fazendo capas com as quais os "Progressistas" concordam.

Ah, esse admirável mundo novo! "Vamos mudar o país! Rumo ao progresso!" diziam há dez anos., e hoje defendem barragens cujo projeto começa na ditadura e condenadas pela maioria do mundo científico, militâncias indigenista, antropólogos, ambientalistas, ecossocialistas, o escambau! 

Outro dia muitos defenderam a ocupação da USP pela polícia porque o povo estava radical demais. ou porque usavam drogas. Índios viraram nômades e não haverá remoções e nem prejuízos a eles com a  construção da barragem. Pra manter a base parlamentar fecham acordo com Ronaldo Caiado e Kátia, Abreu  além do Blairo Maggi, e votam um Código Florestal que devia se chamar Desflorestal.

Como disse um amigo, o Governo entendeu que nada menos popular na maior parte do Brasil que defender índio e árvore. Etendeu também que defender homossexual é impopular, aborto e mais direitos pras mulheres idem.

 "Quem quer um bando de viadinhos ensinando nossos filhos a serem gays? " ou "Aborto legalizado pra que? pra essas putas darem as bucetas e poderem tirar a qualquer hora?", é assim que pensa o mundo. E o Governo entendeu, seus defensores idem. 

É preciso manter o governo, são muitos os companheiros que precisam dele.

Enquanto isso na oposição de esquerda se busca ampliar a presença neste mesmo estado e talvez começar disputar o governo para seguir este mesmo caminho e se cogita aliança com o PV, se filia egressos do PDT e PPS.

Em Vila Valqueire um morador foi assassinado pela milicia porque não pagou o Gatonet. Um deputado teve de sair do país por ameaças da mesma milicia, uma juíza foi assassinada.

O mundo tá ficando difícil de ser encarado sóbrio, mas podia ser pior, porque no Recife foi aprovada uma lei que proíbe o consumo de bebidas alcoólicas em espaço público de 18:00 às 06:00 hs. Lá você só pode encarar o mundo sem ser sóbrio se não sair de casa.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Buscando consensos debaixo das botas

A busca de consensos e de acomodações é uma arte própria de nossa política Brasileña. A própria noção de que propostas radicais tendem a ser inúteis porque jamais serão colocadas em prática é voz corrente na rua, na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapê. Uma filha dileta desta noção é a idéia de que se você "não participa do 'jogo' você jamais é eleito e nunca pode fazer  nada". E o "jogo" ai é corrupção na dura, mas com a tucanada clássica de Pindorama.

Essas noções percorrem o pensamento dos nossos amigos, irmãos, namoradas, e nas padarias de Vera Cruz se consolidam como uma idéia monolítica de política. O problema delas não é só o determinismo de que política só pode ser feita do jeito clássico desde o pré-império ou então não é política, é também incutir como radicais apenas as idéias e propostas que estão do lado gauche da vida. Ou seja, se naturaliza que "radical" é de esquerda e que passar o rodo em meio país de floresta é "normal' e "de Deus".

Então fica aquela coisa pululando nas colunas de jornais, de Blogs, em twitteres e feiciquibuis: "Politica é acomodar-se como sistema pra poder fazer alguma coisa".  Radicalismos como direitos civis pra homossexuais, legalização do aborto, abrir diálogo com etnias indígenas antes de mandá-las pra pitoresca casa do caralho em nome da construção de mais uma barragem, são impedidos de serem debatidos porque "não  passam" e "temos coisas mais importantes pra fazer pelo país e pelos pobres".

E essas "coisas mais importantes pra fazer pelo país e pelos pobres" em geral compõem radicais transformações na vida dos  pobres "reais" que são atingidos por:  barragens que os removem, assim como a seus companheiros das etnias indígenas; por uma educação que os condena, se gays e mulheres, a uma existência oprimida e por vezes cheias da deliciosa e fofa porrada diária; por estradas e estádios  das cidades sedes da Copa e Olimpíada, nos quais jamais andarão ou entrarão.

Assim se segue no baile de abandonar "radicalismos" humanistas para adotar o radical trator de um capital cujo "desenvolvimento" é em geral construído em cima de cadáveres. E vamos nos "desenvolvendo" sem saber que desenvolvimento é esse, qual o preço a respeito dele e o quão é radical este processo onde abandonamos "radicalismos" que reduziriam opressões para abraçar radicalismos que produzem tragédias no presente e no futuro. 

Tiramos pobres de suas casas e cidades parta "melhorar a vida" dos pobres que perdem suas casas e cidades, sacaram? 

Acomodamos com os ruralistas para pavimentarmos o caminho do desenvolvimento que vai "melhorar a vida" dos pobres que por vezes morrem assassinados pelos ruralistas. Abandonamos propostas "radicais" que ofenderiam a bancada da religião para que possamos avançar no desenvolvimento que vai "melhorar a vida" dos pobres cujas mulheres serão condenadas a terem filhos de estupro, por gravidez indesejada porque a fé do Brasil não permite que mulheres tenham o direito de abortarem.

Acomodamos com todo mundo, dialogamos com todo mundo para "melhorar a vida" dos pobres que são massacrados em um processo de desenvolvimento que esgota todos os avanços humanistas para manter uma máquina que não dialoga e remove, expulsa, mata e alimenta a mesma opressão do sistema que deveríamos derrubar, mas estamos ali "dialogando", porque "politica não se faz sem acomodação e mediação".




E seguimos na busca de consenso e conciliações enquanto morrem Guaranis, Lutadores, Sem Terra, mulheres e gays. Buscamos consenso enquanto se constroem Usinas para alimentar a industria do alumínio, se aprovam leis que legalizarão o desmate, se busca criar uma "bolsa-estupro" e por ai vai... 

Enquanto isso gays e antropólogos são espancados em São Paulo, a serpente pariu o ovo e estamos buscando o diálogo.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

O medo estupra a esperança no Governo Dilma

Arnaldo Branco nos idos de 2003 brincava com o Slogan de Lula ao fim da eleição de 2002, "A Esperança venceu o medo", e acho que na nomeação de Henrique Meirelles cunhou o chiste "O medo empata o jogo e sufoca a Esperança".

Oito anos depois Dilma Roussef e seu governo instauram um impasse no diálogo com movimentos sociais, recuam em avanços do Governo Lula e apontam com Belo Monte, o desmonte do Minc e a "Comissão da meia verdade", entre outros atos desgoverrnados, para um avanço cruel do fim de toda a esperança, morta a pauladas por um medo concreto da burocracia não só dominar governo e  Partido, como aliar-se ao pior do ruralismo e do mundo reacionário e realizar o que temíamos que Serra realizasse com requintes irônicos de crueldade. 

Se o Neoliberal carola e neo-fascista foi superado nas urnas o que se vê é um retrato fiel do mais sórdido stalinismo proto-fascista em marcha, tanto no governo quanto no que antes era um partido socialista chamado Partido dos Trabalhadores. 

Em nome do desenvolvimento até a cidadania vira um valor relativo para o governo e seus defensores ferrenhos e plenos em desonestidade, sofismas e truísmos. Cidadania vira algo a reboque de um desenvolvimento que exclui quem se opõe ao avanço do trator do "progresso" seja ele índio, negro, pobre, macho ou fêmea.. opôs-se? passemos por cima.

 "O Brasil precisa crescer", dizem ávidos ministros, apoiadores e milicia progressista que na virtualidade são prenhes dos mais covardes métodos de defesa do indefensável.

A formação de milicias virtuais  para resistirem aos sórdidos ataques feitos à Presidenta nas eleições de 2010 pelos eu adversário e câncer José Serra se mostrou de muita serventia para a resistência ao bombardeio que os movimentos e militantes de esquerda iniciaram quando o governo mostrou-se muito mais conservador que seu predecessor recuando avanços deste e mais ainda, impedindo outros avanços, votando o código florestal que praticamente legaliza o ecocídio, recuando em avanços na educação que seria proporcionado pelo Kit Anti-homofobia, destroçando a comissão verdade ao ponto de impedir que familiares de desaparecidos e presos discursassem em cerimonia e negar qualquer tipo de abertura de arquivos e agora com o recrudescimento da resistência a Belo Monte com uma das mais sórdidas campanhas de desqualificação dos que condenam o apelidado pelos movimentos sociais de "Belo Monstro".

Nos moldes fascistas a tropa de elite Governista chega aos píncaros da Glória de dizer que os indígenas são "nômades" e nem notariam o empreendimento.  Com relação ao massacre dos Guaranis a omissão chega a graus criminosos e nenhuma linha da "nova imprensa" progressista. 

Esta aliás atua ou em bloco insano de defensores a qualquer custo, armados de desqualificação e truísmos sobre Belo Monte ou bastam a si mesmos com um silencio constrangedor, calculado, que torna-se um claro indicio de agirem exatamente da mesma forma que o que chamam de PIG, mas a favor.

O voto que foi arrancado a fórceps de muitos e propagandeado como manutenção de avanços se transformou na abóbora do rodo, do trator, da insensibilidade social, ambiental, de gênero, histórica e anti-homofobia, se transformou no pior pesadelo de qualquer um que olhe pra fora dos antolhos do mais imbecil pragmatismo e se entenda de esquerda, um governo fortemente alinhado ao mais pútrido desenvolvimentismo a  serviço do conservadorismo e nada sensível às causas mais caras dos campos socialistas e de esquerda.

A esperança foi substituída pelo assustador e impotente medo. Um medo que tende a ser duplo, por temer também a alternativa ao estupro cotidiano do mais humanista sentido do que é política.

PT e PSDB  digladiaram por muito tempo para obterem o controle do governo e  hoje capitaneiam a nau de uma sociedade cada vez mais amante de medidas de exceções e do fascismo.

Parabéns a todos os envolvidos.