Mostrando postagens com marcador #DesarquivandoBR. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador #DesarquivandoBR. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Ditadura, DH, Arquivos e outras Histórias

Política, direitos humanos e ditaduras são assuntos cuja relação é pra lá de fundamental a ser debatida pela esquerda. 

Não estou falando aqui só de um posicionamento a respeito,mas da percepção de seu valor como algo que está para além de opções táticas ou estratégicas de ação direta ou de linha de ação político-teórica, está além de eleições, de defesas de postura política ou de superioridade moral ou teórica desta ou aquela escola da esquerda.

São temas transversais, transversais, fundamentais, de determinação valorativa do militante e do grupo ao qual ele faz parte. Sim, estes temas, como as questões de gênero, LGBTT e raciais, são temas de formação  do militante ou grupo, ou seja, se o sujeito coloca estes temas como subalternos a uma tática ou a uma estratégia política sua ou de um grupo ele a meu ver já comete o primeiro pecado capital da burocratização da política: Escolhe entre a ação política e o cálculo de capital político e se apega ao segundo.

São essas transversalidades que a meu ver determinam o "quem é quem" na arena política. Se um grupo ou sujeito entendem que são passíveis de serem colocadas em segundo plano diante de uma possível conquista "superior", como se dissesse "Vamo revolucionar primeiro e depois a gente vê!", ele já denota não ter apego nenhum a questões que nascem do humanismo e que são apropriadas pela esquerda desde seu nascedouro.

A questão de DH, Ditadura e ação política juntas tem em si algo um tanto mais caro que é o apego à memória coletiva de uma esquerda, que triturada pelo estado ainda não tem os corpos de seus mortos para chorar, enlutar e fazer a passagem. Além de toda a questão teórico-política tem o sentido, o sentimento de viver algo e ver diante dos olhos, sob a pele de outros, torturados e mortos, a história jogada pela janela a fora enquanto se "solidificam" governos ou "estratégias revolucionárias".

Nesta questão é preciso termos em mente, e no coração, a ideia do que é a memória, do que é a politica e que a ação ai é político-sentimental sim, é de construção e luta por uma história onde nossos mortos tenham nomes, corpos, datas, causa mortis.

É preciso repetir para que fique claro,é preciso ter nesta luta o coração, um coração grande o suficiente para abarcar todas as dores, senti-las, sabe-las e assim agir.  A "frieza racional" tida por muitos na política como uma qualidade, aqui tem em si o germe também do cálculo, um cálculo que por vezes entrega anéis e dedos e se esquece do companheiro que nunca conheceu que foi esmagado por botas que são hoje engolidas em nome da "conjuntura".

Precisamos do coração, do enorme coração que goteja de sangue ao ouvir, ler, saber dos parentes, dos companheiros trucidados pelo estado hoje ocupado por um partido que deveria ter mais vermelho no coração neste tão delicado assunto e menos o pensamento em eleger o ex-ministro da Educação. 

Precisamos do coração, e talvez da cabeça quente e da rude franqueza, para irmos além do truculento ufanismo de uma "conciliação" pela governabilidade. 

É uma dura batalha,uma dura batalha com quem nunca usou pelicas pra bater. É uma dura batalha que exige mais honestidade e menos educação. Uma batalha pra construir sim uma comissão da verdade comandada pelos grupos de parentes de desaparecidos e cuja vaidade individual ou coletiva tenha de ser abandonada por uma questão maior, muito maior do que a de todos os grupos da esquerda e suas teorias que desprezam por vezes inclusive o próprio povo, chamado de idiota e ignorante por discordar de seus teóricos.

É uma batalha que precisamos lutar para construir uma comissão da verdade da sociedade que possa superar as n traições (E de traição eu entendo) do governo, do estado, da justiça, dos partidos, das pessoas nesta luta para abrir os arquivos da ditadura e punir torturadores, limpando essa nhaca da alma política do país.

É uma batalha para se organizar pontes e não controle. Sejamos catalisadores de uma união entre os grupos que já atuam na sociedade pela abertura de arquivos e punição aos torturadores.

Nesta hora guardemos nossas máscaras, bottons, interesses e oportunismos e entendamos que existem causas que superam nossa individualidade e senso de grupo e para isso precisamos organizar de alma limpa um movimento que ajuda e projetar um país onde a marca da maldade ditatorial, que está no olho da PM, no sorriso do ruralista, não seja repetida por jovens que a cada dia repetem mais o ódio do que a solidariedade e fraternidade libertárias que em algum dia Frei Tito sonhou.

É preciso de coragem, entrega e um profundo senso de dever para isso.

É preciso despir a vaidade.



terça-feira, 17 de abril de 2012

Vamos comer Caetano?

Ouço Caetano desde sempre. Embora  me irrite por vezes suas opiniões, e as ache, em especial as sobre política e cultura, um grande mar de equívocos, suas canções tem uma presença fundamental na minha sensibilidade. O registro vocal, as questões, a própria forma de escrever as  letras, a poética, o barroco, a ironia, o riso, a dor e o lado Logunedé, tudo são elementos de proximidade.

Andava de birra com o sujeito, muita, pelas suas posições escritas em O Globo, muita birra. Ultimamente voltei a ouvi-lo como quem reencontra um velho amigo e sou surpreendido por uma entrevista dada ao jornalista Paulo Werneck, que pode ser lida aqui, onde  entre outras coisas voltamos a concordar em algumas coisas, como: "Hoje sou totalmente pela Comissão da Verdade e não acho que torturadores devam ser perdoados. Os guerrilheiros foram punidos (inclusive com tortura e morte). É enganoso equiparar os dois tipos de crime.". 

Não é preciso dizer que Luis Fernando Veríssimo já havia matado a charada que o leitor só é feliz com o colunista que concorda com ele, e vou continuar discordando do Bardo Baiano em um tanto de coisas, mas muito me deixa feliz que uma voz da qual pouco esperava ouvir coisas como esse saia um apoio explicito a uma prestação de contas pública do país com sua história.

A critica também à esquerda como por vezes comodamente uma fábrica de maniqueísmo montada na fácil ignorada básica quando o autoritarismo veste nossas roupas, que ele cita apontando para o apoio ao imperialismo Chinês no Tibet e questões da Coréia do Norte e eu aproveito para de minha parte apontar o dedão pros apoiadores dos absurdos em Belo Monte, também é outro ponto de fantástica observação, que deve sim ser elogiado.

Caetano não se tornou nenhum Lênin ou Malatesta pra mim, mas em uma ótima entrevista faz excelentes  críticas, constrói excelentes posicionamentos e se discordo dele no louvor a Mangabeira Unger tampouco vou desqualificá-lo por adotar uma vertente ideológica da qual discordo. Há um pouco de arrogância intelectual que despreza o que lhe é díspare, talvez uma versão de "Narciso acha feio o que  não lhe é espelho".



E considero um bom vento quando com toda divergência concordemos, eu e Caetano, tantos e Caetano, que precisamos sim de mais auto-crítica e passar a limpo nossa história, e que com tanta diferença possam se tocar posicionamentos que no fundo abraçam-se no humanismo.

Vamos comer Caetano? Vamos Revelarmo-nos?

segunda-feira, 26 de março de 2012

Memória de um tempo onde lutar por seu direito é um defeito que mata

Não sei falar de ditadura. Não sei racionalizar, construir um argumento com base na História, em como se construiu um estado de exceção, em como se fez a aliança entre civis e militares, com sustentação das elite e suas indústrias, para erguerem um estado que atropelou a democracia.

Não sei manter o eixo sensível separado de forma a racionalizar o uso de tortura contra cidadãos que, organizados ou não, buscavam combater um estado de exceção.

 O argumento milico de que "vivíamos em guerra contra milicias que buscavam instaurar uma ditadura comunista", repetido ad infinitum por jornalistas desonestos a soldo de sei lá quem e pelo exercito de ignorantes que os segue, chega a ser patético em se tratando de qualquer estudo histórico sério que compare a dimensão do Estado Ditatorial com o das "milícias militantes" contra quem combatiam. Se aquele exército de Brancaleone tivesse o poder de derrubar o estado apoiado pela quarta frota estadunidense então a famosa incompetência militar da república de bananas estaria justificada.

O massacre dos anos de chumbo, que exterminou uma geração inteira de lideranças, que enfraqueceu a política tupiniquim sob todos os aspectos, que impactou a educação a ponto de gerarmos mais e mais autômatos que repetem ad nauseum um discurso irrefletido da ordem acima de qualquer coisa, este massacre de valores, pessoas, país, hoje é ressuscitado pelo silêncio oficial diante da responsabilidade do Estado Brasileiro diante de suas vítimas e pelo urro arrogante e autoritário, covarde inclusive, dos responsáveis por sua execução.

Os milicos em seus pijamas; os jornalistas da Veja, Folha e suas ditabrandas; os recriminalizadores dos "terroristas de esquerda" condenados por IPMs duríssimos, sumidos , torturados; todos berram contra uma "vingança" dos que atualmente estão no poder contra os vencedores de uma "batalha" que nos "defendeu do comunismo". 

Torturaram, sumiram com corpos, mataram jornalistas, puseram bombas em shows, sumiram com operários inocentes, tentaram organizar a explosão do Gasômetro no Rio de Janeiro, impedida pelo capitão Sérgio Macaco, a tudo fizeram e foram anistiados e ainda culpam as vítimas por seus atos e por vingança.

Não sei falar da ditadura. Não sei racionalizar a respeito.  Não consigo parar de pensar em Frei Tito, em Wladimir Herzog, em Manoel Fiel filho, em tantos outros presos, torturados, perdidos, morridos.

Não consigo fazer a relação necessária entre o que foi a  ditadura e a  reação conservadora a um ajuste de contas que sanasse essa ferida no corpo da democracia que é a inimputabilidade de quem cometeu crimes e mais crimes contra os direitos humanos no poder e a escravidão. Não consigo construir um argumento coerente que una como herança da ditadura a militarização das torcidas organizadas; o uso de tortura pelas polícias militares; o treinamento de policiais para agredirem manifestantes; o racismo oficial das policias que vinculam inclusive em seus cursos de formação o negro ao bandido e todo o arcabouço de destruição de uma lógica de país que não entenda como abuso a conquista de direitos.

Só consigo ter raiva e frustração de não ver no país a punição de quem tortura, mata, torturou ou matou. Só consigo ter uma raiva feliz de ver uma juventude com menos medo do que eu que vai na casa dos pulhas assassinos de companheiros e companheiras que tinham "Uma crença num enorme coração" e de " humilhados e ofendidos, Explorados e oprimidos,Que tentaram encontrar a solução". Todos viraram "cruzes sem nomes, sem corpos, sem data".

É por estes companheiros que tento por aqui apoiar essa molecada valorosa que aprendeu com amigos e irmãos Argentinos, Chilenos, Uruguaios a ir pra rua e tornar a vidas de quem matou e  torturou, e matará e torturará, um inferno de vergonha. É por estes companheiros que tento aqui lembrar das vozes que "negaram liberdade concedida" e lembrar do tempo em que "lutar por seu direito era um defeito que mata".



Este post faz parte da Quinta Blogagem Coletiva #desarquivandoBR  que se realizará de 28 de março a 02 de abril cuja convocatória pode ser lida aqui: http://desarquivandobr.wordpress.com/2012/03/18/convocacao-da-5a-blogagem-coletiva-desarquivandobr-3/