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quinta-feira, 10 de maio de 2012

Ensinar é um ato político

Uma das coisas estranhas de dar aula é a dúbia sensação do poder e de sua ausência. A ideia incutida de um poder sobre uma massa de estudantes que deveriam ficar em determinado tipo de código de comportamento, à disposição do "mestre", é facilmente destruída diante de uma turma que não compartilha dessa lógica ou desses valores. 

Ao mesmo tempo a posição do professor, a lógica inserida na divisão do espaço da sala entre você (isolado, mas central) e o aluno (numeroso, coletivo,mas disperso), aprofunda a ideia do poder, e do controle de um sobre muitos.

Claro que não é bolinho, não é chá das cinco e nem todo mundo se relaciona com o poder ou com o espaço disposto para sua realização da mesma maneira ou tem treinamento para isso.

Dar aula é também uma disputa tentadora sobre o controle de um espaço, assim como é um exercício de controle ideológico do professor sobre a turma, seja ele representante de uma causa pessoal ou apenas da causa do Estado, reprodutor direto da linha ideológica inserida nos planos curriculares.

A ideia do poder está inserida na disputa do espaço, exposta nas relações,especialmente perceptível no controle sobre o som, sobre a voz e os silêncios, apresentada na relação de mérito e demérito via acréscimo ou redução de pontuação para as notas bimestrais. É uma lógica que dança em meio à sala de aula, que é supra presente, clara e é percebida pelo professor e pelo aluno.


A forma como se relacionam professor e aluno diante da situação é também compreensível na forma como o professor entende sobre o que é o aluno. O professor que entende o aluno como um ente de uma sociedade diferente da qual ele, professor, foi resultado, que vive uma escola diferente, fruto de tempos diferentes, este tende a perceber a necessidade de uma nova negociação de poder tanto espacial, quanto comportamental, usando ou não artifícios punitivos como adendos à negociação.

No entanto o professor que entende o aluno como um problema, pois deixa de ser o aluno ideal, um tipo ideal de aluno, nascido e crescido em outra época, fruto de uma outra sociedade, resultado de uma lógica de educação nascida e crescida em tempos ditatoriais ou filha dileta de uma compreensão jesuítica da relação professor/aluno onde o poder central sobre o coletivo é o professor despótico que  deve ser respeitado de per si por "condutor da luz", este professor é o que culpa o aluno, o aparato do Estado, o universo pela adversidade do aluno real ser diferente do ideal.

Dar aula é também uma disputa tentadora entre uma realidade concreta, que com os defeitos conhecidos contempla a diversidade, e um tipo ideal de educação que é doutrinamento, que é um resultado autoritário de uma lógica de formação que mal foge da escolástica.

Não há aqui nenhuma intenção de isentar a lógica educacional da omissão do aparato estatal no dever de pensar a educação como algo maior do que estatística e que aprovação máxima não é medida de educação, que são necessárias mudanças claras na lógica do ensinar, do numero de alunos por turma, dos equipamentos disponíveis para o professor, da própria aparência das escolas e do entendimento da interdisciplinaridade, do que são as disciplinas, seu papel e como é a melhor forma de ministrá-las.

Porém, não é possível ignorar que a lógica de ensino do professor, que também é uma atribuição do aparato estatal, é hoje anacrônica, que entende o aluno como um mero receptáculo de valores externos a ele sem critica. 

Não é possível deixar de entender o aluno como mais que uma caixa de ressonância do poder central "iluminado" do professor e que reage, até pela vivência de uma realidade onde o poder não pode ser exercido de forma despótica e cujo papel da própria família foge à lógica "clássica" da família classe média papai-mamãe-filhinho-cachorro-papagaio, foge à ideia do poder patriarcal central,  que coloca à frente da molecada a família da mãe chefe, da avó chefe, que dá a eles poder sobre irmãos menores e responsabilidades, que dá a ele a percepção da possibilidade de , cada vez mais cedo, desafiar um poder que não media.

O sistema, o professor, a sociedade, ainda entendem a escola como uma forma de ação de inclusão no aluno de um espírito de civilidade que não perpassa o entendimento da realidade do aluno e de sua comunidade do que é civilidade.

A civilidade é externa ao aluno e à sua rua, sua comunidade. A civilidade é uma imposição não mediada de uma lógica de "valores' que ao serem recusados como válidos pelos alunos por não serem seus gera a culpabilização do aluno por recusar valores que para ele não ecoam na sua vida cotidiana e em seu tempo. É a civilidade que busca "ensinar valores" e não compartilhar valores, desenvolver valores consensuais.

É a civilidade que criou a Revolta da Vacina, que ignorou o que a população entendia sobre o ato de vacinar-se , sobre o que era uma vacina, sobre o que era homens aplicando vacinas em mulheres, entre outros conflitos advindos de uma ideia de modernização autoritária, de cima pra baixo, que ignorava, como ignora, o que pensa e como é o povo ao qual ela é dirigida.


E é neste caso que a escola, que a meu ver deveria ter um papel de mediação entre a casa e a sociedade, torna-se o palco de conflitos de valores que atordoam professores, que sonham com a idade do ouro do aluno-soldado e tornam os alunos agressivos defensores do seu nicho de poder, conquistado numa batalha onde o número e a cacofonia , a algazarra, são armas entendidas, conscientes, de uma recusa à "colonização".

Não se pretende aqui defender uma receita de bolo, até porque são as receitas que produzem e reproduzem uma lógica de educação que por mais bem intencionada que seja não atinge à simples lógica de convencer ao aluno, a seus pais e sua comunidade que a escola é o espaço de construção coletiva da sociedade que queremos. 

Se pretende no entanto defender a ideia de que uma educação de qualidade passa pelo entendimento social do que é educação, coletivo, dialogado, construído entre aluno, professor, pais, diretores, funcionários, comunidade.


O espaço de disputa de poder, legítimo e necessário, na sala de aula é representante mesmo de uma disputa de poder concreta que existe na própria ideia de escola, pois escola é também o primeiro espaço da sociedade aberto às gerações que serão os atores principais da sociedade em alguns anos.

O espaço de disputa de poder na sala de aula é também uma responsabilidade mútua de professor e aluno na construção de uma escola, é uma responsabilidade e um poder que o professor detém, mas mediado com o coletivo de alunos, em uma relação que não pode mais ser resultado da figura olímpica do mestre como detentor dos direitos de aprovação e reprovação.

É neste sentido que dar aula é um ato político. Ensinar é um ato político e é nele que o homem político que se veste de professor se revela, como algoz, como mestre ou como mediador. 

É no ensinar que o professor entende-se como parte de um sistema montado na imposição opressiva de uma ideia de realidade ou como ator de transformação.

Por não perceber isso a sala de professores muitas vezes ecoa a permanência de sua exclusão de protagonista do ato político em sua exigência conservadora de valores monolíticos. 

Por recusar-se ao papel de transformador, de ator coletivo, de mais do que um trabalhador que busca melhores salários, o professor muitas vezes se omite na transformação do sistema.

Omitir-se é um ato político.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Entre dois tipos de Barbárie


O papel do professor e da escola, como tudo, mudam historicamente. A globalização, as falhas do sistema de educação, a linguagem, a exposição à linguagem não escrita como hegemônica na comunicação, ao multiculturalismo, o combate ao racismo e à homofobia, a conquista de direitos da criança e adolescência via ECA, muitos fatores competem para levarem à necessidade de um repensar global da educação.

O professor não é mais o “mensageiro da iluminação” oriundo do século XIX e nem a escola é simples o “posto avançado da civilização” que vai levar conhecimento aos “selvagens”. Esta postura Jesuítica é desmontada, foi desmontada, por uma série de fatores positivos e negativos que vão desde o negativo desmonte da escola como protagonista da formação de seres humanos aptos à uma reflexão critica sobre o mundo, até a positiva mudança do eixo da educação como imposição de “luz” a “pobres ignorantes” para uma educação de interação de linguagens e explicações diferentes do real, a da ciência , da academia, aliada à percepção “nativa” dos alunos e comunidade sobre o real.

Ao capitalismo, ao sistema governamental que o serve e à hegemonia político-cultural que controla ambos no país não interessam mudanças substanciais no eixo de formação pela educação,basta uma educação regulamentada pela hierarquização de conhecimento e papéis a serem executados, uma “construção” de seres aptos aos diferentes níveis de exigência do “mercado’. A alguns é permitido voos mais altos, a outros basta saberem não se cortarem com facas e atravessarem as ruas. Daí níveis diferentes de investimento financeiro ou de programas pelo poder público e privado nas diferentes regiões dos estados, cidades e do país na educação. Dai também a maior preocupação com índices de aprovação do que com o resultado prático do ensino, que é o que o “alunindio” aprendeu da “civilização”.

A escola, que varia de lugar pra lugar em sua aparência, é nas regiões mais pobres um depósito de pessoas, cuja política educacional atinge em geral para apenas tolerar sua presença e deixá-los partir quando acabar o tempo exigido da mesma. A escola como espaço de mediação entre família e sociedade fracassa ao fazer o aluno ao chegar ver sua face deteriorada, no aspecto opressor, escuro,retentor, agonizante. O abrigo da família é confrontado com o abandono da escola. É chegar, tolerar quatro horas e meia,sair livre. É nítida a felicidade ao sair, fora os amigos,pra quem tem, o que salva no ir à escola?


O professor é refém de uma formação que o torna um sacerdote mal pago e responsável último por todo o sistema, mesmo ele sendo abandonado pelos poderes à míngua do parco salário, péssima estrutura de apoio,nenhum programa politico pedagógico que envolva sociedade, poderes públicos e academia como fim de formar um eixo de transformação e melhoria da escola. Ao professor cabe lidar como aluo mal adaptado no espaço de mediação chamado escola, mal visto,atendido e respeitado, a ele cabe cuidar como substituto da Família nessa creche prolongada do aluno.

O ECA e outras conquistas, por vezes culpadas pelo professor e direção das escolas, impedindo o abandono pela escola, e pela sociedade, de crianças que não fossem a moleza adaptável, levaram uma responsabilidade ao estado que foi transferida para a ponta, pra escola e por isso ao professor. Os alunos que antes eram jogados às feras da rua foram corretamente abrigados pela força da lei no aparato estatal pronto pra isso,a escola, quem o estado deveria tornar capaz de absorvê-los, assumindo a responsabilidade pelo todo da sociedade e não apenas pelo lado “Palatável” dela. Assumindo a responsabilidade e aparelhando a escola para tal,com mais do que TVs, Computadores e DVDs,mas com profissionais capazes de fornecer o suporte psicológico, pedagógico e de segurança para que o responsável final pelo aluno, o professor, pudesse atuar.

Este Estado, no entanto, opta pela comoda e solene omissão, deixando a ponta no abandono,”vendida” e tendo de lidar com suas próprias contradições e responsabilidades e dom as do aparato estatal como inteiro.

O professor precisa entender seu papel de mediador “de conhecimentos”, como um orientador para que o aluno se relacione com o real à sua volta e juntando-o com o conhecimento vindo de fora construa sua própria e autonomia capacidade de lidar com o todo? Claro. O professor também precisa descer do púlpito do sacerdócio? Óbvio. A escola precisa ser mais do que um “presídio” de jovens e crianças? Sim. A escola precisa deixar de ser chata, como foi para os pais destas crianças, e liar com a diferença cognitiva que a tecnologia trouxe? Óbvio. No entanto como fazer isso se seus pés e mãos são cortados? Se sua responsabilidade sobre as crianças e sua obrigação de lidar como seres com direito não possui o apoio necessário,o suporte necessário pra lidar com todos os problemas advindos dessa mudança de postura? Como fazer isso se não há para com ambos a formação necessária, nem nas universidades e menos ainda no investimento do estado para a construção dela via programas de apoio?

A mudança na educação de hoje passa sim pela mudança do professor pela melhoria do professor, pela melhoria da escola, mas antes de mais nada passa pela mudança na sociedade ao redor da escola e pelo estado, que ignoram a ponta e tratam ambos como se fossem escória. Da mesma forma a mesma sociedade que culpa professores pelo mal da educação é aquela que finge não vê-los quando estes após anos de estudo recebem menos que o mais mal pago servidor, tratado suas greves apenas como transtorno.

Esta mesma sociedade acredita que educação é o empilhamento de livros e “conhecimento’ das escolas pagas que preferem ignorar o real à sua volta, discuti-lo, debatê-lo, e formar gente,pessoas,formas de vida racionais e criticas e não robôs reprodutores de preconceito e que os servidores públicos abandonados nas escolas publicas são “vagabundos”.

Enquanto isso a escola como “posto avançado da civilização” falha nas duas pontas, na privada e na pública e o anacrônico professor é massacrado, proletarizado e destruído. O resultado e ou a barbárie com bacharelado ou a barbárie do abandono.

Acreditem, nenhuma das duas é bonita.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Solucionáticas?


No texto abaixo eu meto uns paus, faço umas críticas e reclamo de umas coisas, entendi que estava também incluindo algumas solucionáticas enrustidas no apontamento da problemática. Seguidor das leis de Rei Dadá esperava e entendia que alguns apontamentos incluídos sub repticiamente no texto ficariam claros, mas amigos bem sacadores não sacaram e resolvi escrever as propostas num “Que fazer?” caboclo meia boca.

Primeiramente acho que é bom explicar, embora seja óbvio, que de Lênin eu não tenho nem a careca. Segundamente não tenho experiencia forte em administração pública, ou seja, jamais atuei no poder então meus pitacos são especificamente de fora, cometendo obviamente deslizes no que foge à minha alçada.

As críticas que coloco relativas aos posicionamentos partidários são simples de esclarecer o que proponho: Fortalecimento das instancias internas com nucleação forte, nucleação de base com relações inter núcleos via plenárias regionais frequentes e com isso levantamento de questões à plenárias de direção que encaminhem diretrizes às executivas partidárias. O uso de um falso centralismo democrático travestido de colegiado de correntes e tendencias é golpe imediato na democracia interna de partidos como PT e PSOL.

O PSTU e PCB já partem do centralismo democrático clássico, críticas à parte sobre a existência ou não de burocratização neles, mas partidos como PSOL e PT se colocam como partidos de correntes de de núcleos, se você interrompe o oxigênio partidário com enfraquecimento dos núcleos você amplia a burocratização e mata o partido, ao menso a diversidade e se bobear sua inclinação socialista, ainda mais se a opção pelo eleitoralismo levar à filiação de grupos que nunca foram parte da esquerda, nem mesmo na proximidade pontual.

Pra sair da armadilha de comportamento olímpico com relação ao povo sem uma relação direta de convencimento acredito que o primeiro momento é abandonar a ideia da população não ter consciência e ir no caminho antropológico de “etnografia”, ou seja, viver com a população e dialogar, colocar as ideias no pano, ver qualé, passear pelos locais, discutir, interagir e sim, ser convencido também. Atividades e pesquisa são fundamentais, entender a dimensão das relações sociais e de parentesco nas comunidades idem, entender o que significa honra, palavra, dádiva,etc, mais ainda.

É fundamental desconstruir a ideia de povo como algo dado e cuja definição de Marx é tomada como regra e não o como Marx chegou a esta definição. Nada é menos materialista do que pegar uma ideia construída fora do dia a dia político brasileiro como fundamento para análises nossas. E mesmo em muitas análises feitas por brasileiros a ideia de povo é tomada via “bancada”, ou seja, o povo é visto do alto de uma análise de classe média/alta ou mais ainda mesmo quando vista in loco trabalhada com o arquétipo de povo. Sem contar que devíamos escrever “povo” dada a diversidade do que significa esta categoria.



De que povo estamos falando? Como ele respira, ouve, lê, anda, fala? Tem sotaque? Que sotaque? De onde vem esse sotaque? Como são as relações de gênero deste povo? Como são as relações entre fenótipos diferentes? Como são suas construções? Como eles veem e querem suas casas , ruas, escolas, trabalho, sexo, música? São perguntas abertas, e é óbvio que são feitas também da “bancada”, porque as perguntas mudam de acordo com o campo. É preciso que a “prática como critério da verdade” seja algo além de um discurso e algo além de pesquisas quantitativas e observação abertas, cheias de estereótipos de uma população variada país afora. É preciso abandonar o anti-intelectualismo e o medo da ciência e largar de mão dogmas pseudocientíficos e filosóficos que por vezes travam e são atualizados até mesmo dentro das tradição ideológicas por outras formas de abordagem do real. 


É preciso para nossas relações políticas irmos além do aparato e arcabouço puramente ideológico e acrescentar a ele o que se produz como ciência. Dessa forma talvez tenhamos menos comunistas com elitismo cultura ou machistas. Talvez com isso tenhamos menso comunistas que tem um belo discurso, mas reproduzem os mesmos preconceitos culturais, de gênero e raça que dizem combater.


Não precisamos gostar de funk ou de ruas apertadas ou de pagode ruim, ou de letras de música dizendo que a mulher tem de chupar pirocas pras entender que isso é sim culturas e é tão legítima e válida quanto Chico Buarque. E é preciso menos moralismo cultural, menos rotulação sobre como deve ou nãos e comportar o diferente.

Muitas vezes lemos que o que diz a Tati Quebra Barraco é reforço no machismo, mas é mesmo? Lá no ambiente onde foi construído grito da Tati é reforço ao machismo ou ofende o machismo local? Aposto na segunda opção. A mulher dizer claramente que faz sexo como quer e não é vagabunda é como queimar sutiãs naquele ambiente. Podemos discutir o quanto isso na nossa concepção de comportamento é reprodução e nessa viagem inter grupos sociais como o conceito exposto pela Tati é por nós entendido, mas antes de usar esse entendimento para explicar universalmente o significado da música convém ir lá e ver in loco como essa música funciona na cabeça de quem fez e de quem ouve primeiramente, antes da viagem da favela pras boites da zona sul carioca.

Comunista que chama funk de sub música tá numa redoma, e pior, reproduz um preconceito que diz que música é apenas uma música aprovada pelas classes dominantes, cujo gosto foi assumindo pelas classes médias. No início do século XX essa sub música, também originada fora do país, era o samba. Nas décadas de 1950 a 1970, iniciozinho, essa sub música era o rock.

Da mesma forma é preciso ações de conquista de diálogo horizontal como uma juventude que anda por ai doida por um 15-M tupiniquim. E acredito que do mesmo jeito da relação com o “povo” é preciso entender que rapaziada é essa. É preciso entender que determinadas construções da forma partido cuja horizontalização e trajetória das discussões e processos decisórios é interrompida são o fim da picada pra uma multidão de pessoas que estão expostas à fragmentação da comunicação n cotidiano chamada Internet. E essa fragmentação não é quebra, é diversidade, é polifonia, a ideia de síntese, cujas discussões determinam um ponto de convergência pode estar sendo substituída na prática pela ideia de polifonia, onde todos os grupos e desejos se materializam na ação direta, onde não é preciso esperar a revolução pra discutir o problema de gênero, por exemplo.

Há problemas nas manifestação espontâneas de Madri ao Cairo, na primavera árabe e na rebeldia europeia? Claro, e esses problemas são menso da diversidade e mais da ausência de organicidade. Essa organicidade não significa que todos tem de empunhar a mesma bandeira, mas talvez da organização dessas diversas lutas no sentido de também derrubar o inimigo. Não necessariamente focar numa bandeira única, mas ampliar as lutas diversas, todas nas ruas, todas com solidariedade mútua e todos sufocando o inimigo numa batalha em várias frentes, mas ao mesmo tempo agora.

Para combater a crise da esquerda é preciso antes de mais nada entender o “público alvo”, depois entender que estamos em crise e perder o saudosismo da unidade perdida. A partir desses passos talvez tenhamos muito mais ganho do que estamos tendo e podemos enfrentar a ideia do estado à nossa frente, inimigo ainda, e também do governo que deve sim ser pressionado para a realização dos desejos desse “público”.

Com isso talvez a esquerda possa ir além do que está sendo feito. Um exemplo é a luta pelos 10% do PIB para a educação, fundamental, mas que para na luta por verbas e que pode e deve usar as mais diversas experiencias de esquerda para a educação, da “Escola do Aluno Caminhador” à “Escola Possível” de Miguel Arroyo, iniciativas que partiam da realidade do aluno para construir um processo educacional que minimizasse a violência da “socialização” via educação. Paulo Freire tá aí pra isso.

Será que a escola que queremos é só a escola com 10% do PIB pra educação? Como é o professor na escola que queremos? Como é o aluno? A educação já é um assunto tão periférico, cuja importância merecia aspas, pois fica mais no discurso do que na prática de entendimento crítico de seu papel, porque os profissionais da educação não levam pra rua o papo sobre a escola onde estudam os filhos da sociedade? Porque nós os lutadores não vamos pra rua pressionando a sociedade a entender o que ela está fazendo apoiando bravamente a luta de bombeiros e ignorando a luta dos professores de seus filhos, que são tão massacrados e proletarizados quanto os vermelhinhos e tão vítimas quanto os alunos de uma escola que deforma, que humilha, que entedia e que destrói o indivíduo o tornando em geral um mero repetidor? Qual o medo e ir além do econômico e também repensar publicamente e em conjunto com a sociedade o próprio sistema de educação? Será que enfrentar o pai da criança, que foi aluno da mesma escola deformadora e por isso também tem uma péssima ideia do professor como inútil é tão difícil?

Além disso, que governo queremos para nós? É apenas um governo bacaninha que faz o “bem pro povo” ou é um governo que amplie a imersão do “povo” nos processos decisórios? Cadê a ideia do Orçamento participativo e sua adaptação para meios de interferência popular direta e embate político constante na sociedade que seja federal? E que estado queremos? É esse ai adaptado ou outro? O Outro mundo possível é um mundo velho com Botox?

Enfim, na busca pela solucionática acabei criando outras problemáticas e nem paro no ar que nem beija-flor.

Algumas sugestões estão ai e podemos sim avançar a partir delas, indo além do discurso, colocando o assunto à baila e na prática. Talvez com isso comecemos a disputar a hegemonia das consciências coma direita, sem levar luz, sem tentar pagar de “orientador”, mas debatendo e discutindo, colocando soluções práticas, debatendo soluções práticas, de baixo pra cima, à esquerda de quem entra.