"De
Tudo ao
meu Amor Serei Atento"
, um verso de Vinícius de Moraes.
Estranho
neste espaço o amor vir e vir duas vezes. Talvez conquistando da
aridez da História e da política o espaço exigente dos que não se
prendem nas amarras dos versos e poesias.
Mas é
o súbito do amor que garante seu espaço nessas entrelinhas
transversais que antes de mais nada é fundador. Pois é o amor às
gentes e às diversidades que construiu cada tijolo do espaço, como
quem constrói um fortim de humanidades. Nada mais justo que um dia
personificado se mostrasse como quem reconquista o espaço do
individuo.
"De
Tudo ao
meu Amor Serei Atento"
,diz o verso. E à atenção dá um tom de ação, uma urgência de
uso, utilidade, arma.
Como
ser atento ao tudo, ao todo, se secessionamos? Como dividir em
evangélicos, negros, pobres, ricos, velhos, novos, burros, gênios,
limpos, sujos? como levar a cabo o ideal democrático, uma das faces
do amor, se flexionamos a democracia em uma formação de castas
submersa à máscara teórica disponível?
Como
sermos o todo se não somos o dois? se não somos o outro?
Essa
abordagem já foi feita teoricamente aqui de diversas formas, citando
a disparidade do discurso com a prática que inclua a disputa
política pelo convencimento do outro e não por sua classificação
como lúmpen ou sub-humano desintelectualizado e
"inconsciente' ou "alienado". Porém o que é isso sob
o ponto de vista do subjetivo?
Como
meio amar? como ser meio? Como ser meio humanista,. meio elitista,
meio socialista?
Como
amar um alguém e dizer que ama uma humanidade e ao mesmo tempo não
amar o outro e buscar entender o outro para além de nossas próprias
e comuns deficiências de percepção do outro como tal? Como se
colocar ao lado da classe trabalhadora, mas condená-la se não
ouvem Schubert ou Chico Buarque e ouvem Teló? como condená-las ao limbo dos idiotas se rezam, creem, doam seu dinheiro, fruto de seu
trabalho, por sua fé? Como chamar seu deus de resultado de
esquizofrenia e postar-se, a meu ver cinicamente, como seu aliado,
amigo, amante?
Como
ser um homem para uma mulher e recusar-se a não rotulá-la como
biscate, puta, séria, trabalhadora, viva, morta, autêntica, burra?
Como saber o que é o outro sem sê-lo?
Eu
nasci em Deus, eu nasci de Deus. A fé é para mim a estrutura
básica do que sou. A história é vista com olhos de Exu. O amor é
fruto dos braços de Oxum. Jesus me levou pelas mãos muitas
vezes, Marte idem. Ogum me dá a segurança de amar ao todo e
largar-me no risco da insolvência pelo excesso de convicção que só
os de Logunedé tem a sorte de manter.
Eu
nasci amor, fruto de amorosa rede de gentes que carrego em cada
letra. Gentes que suportam o fogo de meu pouco trato social e
entendem mais do que mesmo eu consigo ver.
Me é
incompreensível o humano sem a imensidão do coração tornado arma.
Mesmo quando a fúria autoritária se apossa dos meus passos é o
entendimento corpo e alma do humano como medida de todas as coisas,
inclusive das divinas, que me conduz na busca do entendimento da
diversidade, democracia e liberdade como valores máximos.
E se
me é incompreensível o fundamentalismo com fé, idem o
fundamentalismo sem ela. Me é incompreensível o elitismo que se
coloca tutor do povo em relação à cultura, que trata o funk como
sub música e samba seu avô pelas praças, assim como me é
incompreensível amar uma mulher sem amar seus mundos, fundos,
letras, pés, mãos, corpos, almas, cheiros e voos.
"De Tudo
ao meu
Amor Serei Atento" , um verso. Poderia ser um lema.
Uma lema pois
que retornasse a percepção ideológica do amor como ente, parte
fundamental de toda ideologia humanista, que retirasse o viés que
exclui a reflexão sobre o outro do combate diário pela conquista do
estado. A doação diária e sensível que faz a esquerda permanecer
no combate contra a opressão capitalista, que luta contra o ethos de
priorizar a propriedade por sobre a humanidade, o direito ao ter
sobre o direito ao ser, este movimento é um movimento de amor, uma
declaração de amor ao humano. E ouso dizer que mesmo os liberais
em sua fundação humanista não são outra coisa em sua busca pela
liberdade contra o estado senão apaixonados pelo humano como medida
de todas as coisas. Anarquistas nem se fala, são verdadeiras
Biscates ideológicas (sob o prisma do Biscate Social Clube) amam numa nice, sem crises.
Esta declaração
de amor ao humano não se pode permitir racista, machista ou
homofóbica. Não se pode permitir transigir com o excludente. Por
isso o racismo e a misoginia me atingem, mesmo eu sendo o macho
adulto branco (Sempre no comando, Caetano?) .
Sem que percebamos
a dimensão do Amor, ou a subjetividade do sentimento de ação
libertária como Amor, nas lutas diárias elas se transformam neste
eterno arranca rabo de ocupação de espaços limitados e/ou a
conquista de postos.
Não é a ideia que
constrói a solidariedade intrínseca na construção de laços, é o
respeito e o sincero abraço, é o riso, é o copo, é o saber-se
igual, mesmo que diferente.
"De Tudo
ao meu
Amor Serei Atento" , um verso. Poderia ser uma
práxis.
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