Não conheço o suficiente do movimento feminista pra discorrer sobre concordâncias ou discordâncias a respeito de modus operandi. Somado a isso tendo a me envolver diretamente com as lutas dos oprimidos de forma a absorver como verdade suas bandeiras. Há o risco de ser acrítico por vezes, mas o risco vale diante da lógica de necessidade de apoio às resistências e demolição da opressão, inclusive a presente no inconsciente meu, seu, nosso.
Amar uma mulher feminista traz em si o automático interpor de questões não colocadas, não trabalhada sou pensadas anteriormente e naturalizadas por vezes, mesmo em quem se considera um exemplo de combatente contra as opressões e amável aceitador da auto-crítica (e não necessariamente da crítica).
E mesmo em quem se observa e se critica, e se corrige, impressiona e assusta a presença ali da resistência machista.
A terminologia usada no tratamento às mulheres me foi colocada pela primeira vez em termos mais amplos do que estava acostumado a entender e pensar. De óbvios combates ao "pegar àquela mulher" começamos a pensar no termo "menina" no "gostosa" gritado na rua. E sem ironia assusta o quão a opressão arraigada na língua e na cultura se espalha de forma a penetrar (ui!) nos mais profundos recônditos da palavra.
O uso do termo menina como forma de diminuição infantilizadora da mulher e o grito de gostosa no meio da rua em altos brados como determinante da mulher enquanto escrava do seu corpo, são elementos assustadores.
A forma de introjeção da opressão através das palavas, velha conhecida, se torna novamente uma forma de susto. Mesmo considerando as variações do uso dos termos, dos tratamentos, das lógicas contextuais é de se pensar, e de maneira firme, sobre o impacto e o quanto não se parece com opressão o que opressão é.
Mesmo sendo partidário do "nem tanto ao mar, nem tanto à terra" no quesito cultura, pois esse bicho costuma ter mais subjetividades e variações que rompem com lógicas mecânicas, não dá pra não entender que sim, há o impacto do uso das palavras, e estas foram exemplos, no trato da mulher enquanto forma de redução desta a um papel secundário, infantilizado e reificado. E mesmo sendo amigo íntimo do medo do mecanicismo sem reflexão aplicado ao falar tornar-se como uma camisa de força, não há como negar que entender que sim, há espaços e há uma conotação em vários termos e usos da língua que são armas de permanência, de manutenção, de uma colocação da mulher em segundo plano. O mesmo vale para termos relacionados a negros e gays.
O fato é que pro macho, adulto, especialmente os brancos, a naturalização da língua como liberta da reprodução de preconceitos, especialmente para os que a dominam, é um aspecto a ser reconsiderado quando se percebe que em dimensões alheias ao que é seu, a seu mundo, as palavras ferem e como navalhas relembram de estupros a desqualificação na casa, na faculdade, no trabalho, na rua, na chuva, na fazenda.
Ao ouvir "É uma menina" talvez ecoe em seus ouvidos o equivalente ao "O senhor é um moleque".
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