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sábado, 1 de dezembro de 2012

Militância, academia, teoria e prática.


Qual o papel da história na militância? Qual o papel da academia? Essa pergunta sempre rondou a cabeça do escriba, inicialmente trocando História por Ciências Sociais nos idos dos anos 90 quando a pergunta rondava a respeito destas, se eram ou não úteis pra transformação do mundo, para a revolução. 

Hoje a pergunta continua, mesmo que com viés diferente, a respeito da História.

A resposta é a mesma de anos atrás: Muita.

As ciências como um todo possuem um aspecto fundamental no processo politico, obedecendo inclusive à determinações relacionadas ao viés do autor, da instituição para a qual produz, ao tipo de trabalho,etc. A História, assim como as Ciências Sociais, não está imune a isto e pode pender
à esquerda e à direita de acordo com a vontade, a situação de classe, à cultura construída e transformada do indivíduo em sua trajetória de vida.

A questão é que o papel das ciências e em especial onde atuo, na História, não é um papel exatamente direto, no sentido de sua produção servir diretamente ao papel revolucionário. O resultado pode sim servir ao ator revolucionário, mas o ato da produção deve antes servir à revelação do que esta oculto nos vestígios do passado recolhidos pelo historiador em sua trajetória.

Não se está pregando uma neutralidade, dado inclusive que a escolha do objeto de estudo já obedece a critérios ideológicos claros ou não para o autor, mas se colocando que a produção não pode ser levada a cabo com o objetivo de provar algo que não está colocado pela fonte, pelo fato, pelo objeto, embora seu resultado seja objetivamente um fator importante de desvendamento do concreto, o que em última análise permite ao ator político, o revolucionário, construir uma trajetória tática a partir do desvendado.

A questão é esta: O ator revolucionário, o militante, obedece a questões e a um papel que o Historiador deve evitar quando da produção da análise sobre o objeto. A ação da ciência, embora jamais neutra, deve-se ater ao critério e ao mais alto rigor científico, que pode por vezes contrariar a percepção imediata militante que movida a questões subjetivas relacionadas a objetivos políticos tende a distanciar-se do rigor exigido pelo mundo acadêmico.

Ambos observando o mesmo objeto tendem a perceber variações diferentes. Ao militante é permitido que tire conclusões não definidas pelo objeto de estudo, ao historiador não. Uma mesma pessoa em momentos diferentes pode executar os dois papéis.

O Historiador que observa a vida dos homens e mulheres negros residentes na cidade do Rio de Janeiro no fim do século XIX, entre o fim da escravidão e os anos posteriores à abolição deve buscar analisar com extremo rigor a vida destas pessoas através da análise documental, assim talvez entenda melhor seu cotidiano e a influencia de sua vida e da cultura ali criada nas gerações posteriores.

Ao Historiador não é permitido afirmar peremptoriamente que a vida destes negros é fundadora da cultura cotidiana do carioca, já ao militante esta dedução não é negada e nem o entendimento de uma base negra na cultura do carioca de origem popular, a ele não é exigido uma prova ampla de sua afirmação.

Não que seja permitida ao militante a desonestidade intelectual e factual, mas a ele são permitidas licenças políticas que o eximem de uma prova ampla, rígida, cientificamente embasada que são exigência profissional do cientista.

O cientista que também é militante tem de entender que suas impressões não rigorosamente científicas não devem passear pelo perigoso terreno da academia, e nem ao inverso suas impressões políticas devem ter a liberdade tão ampla que contradiga sua produção científica.

Talvez a chave que construa uma explicação realista desta contradição de papéis seja o fato de que ao cientista o elemento “ação” não seja exigido e que talvez por este motivo o militante, levado à ação por vezes com as construções teóricas “à mão”, disponíveis, não possa aguardar a definição científica, que exige naturalmente uma demora maior.

O problema de um é a necessidade de um rigor que atrasa por vezes o movimento e a ação, e o de outro é o possível e provável açodamento, que por vezes produz rachas, erros enormes, e rompimentos inegáveis.

Talvez sem a academia a construção de uma ação militante completa seja impossível e talvez sem a militância caiba ao acadêmico a estagnação, inerte na ausência da percepção do ver científico como também alimento da ação militante, dado que ao revelar o real produz o desenho do caminho que a ação política precisa para transformar este mesmo real.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

O Ethos Acadêmico e a Classe Média Sofre

Existe um ethos acadêmico.

Sim existe um ethos acadêmico que permeia a esquerda, a direita, o centro e vive dentro de cada um que lá está. Não é difícil entender o porque, dado que toda a sociedade e todos os grupos sociais mantém uma cultura  própria dentro da Cultura-mor que é comum a todos e "gere" comportamentos e percepções do real, conscientes e inconscientes. Todo grupo social mantém uma  cultura que se reflete em jargões, modos de andar, gosto musical, humor e também em participação política.

O Ethos acadêmico, este corpo de formatos que acabam invadindo cada ente que participa da academia, é relacionado diretamente com a lógica científica de construção de verdades e de revelação de verdades, fenômenos, descobertas. A academia quer descobrir o real, não exatamente transformá-lo.

Além disso, existe um eixo meritocrático que hierarquiza os participantes de acordo com uma classificação de valores que inclui inclusive os títulos como eixo de definição de valor do indivíduo. Esse eixo não pega só no sujeito acostumado com essa lógica, que vive em um habitat cultural que permite não só a manutenção desse arcabouço valorativo, mas estimula sua preservação. Esse eixo também persiste e se reproduz em quem se identifica como Esquerda.

E é neste aspecto que a lógica da Esquerda tem um embate direto como Ethos assumido pelo acadêmico, que é impulsionado à transformação no mundo ideológico, mas que abraça a manutenção no âmbito de seu sistema de valores pessoal e de seu grupo.

É ai que o "revolucionário" da Rua humilha um aluno em público por este não entrar inteiramente nos critérios assumidos por ele como definidores do valor do indivíduo. O "revolucionário" da rua é conservador e mantenedor de uma hierarquia rígida no interior do grupo social onde atua, no interior de seu habitat.

É por isso que vemos professores defendendo uma práxis revolucionária em assembleias de partido, sindicato, seminários e palestras e tripudiando de um doutorando em redes sociais ou humilhando um militante que por acaso não seja versado completamente na literatura acadêmica a respeito de algum tema ou fazendo troça de defensores da revolução que por acaso não consigam definir como será o futuro (Até por não serem Mães Dinahs).

Por isso também que o Acadêmico tende a estacionar na defesa de reformas e não avançar muito na lógica revolucionária, por ter como eixo de construção de sua visão do real a dupla função de revelar, descobrir o real, com a de manter a estrutura que o constrói  e localiza no espaço social:  O mérito e a hierarquia.

Ao Ethos Acadêmico a  Revolução é tanto uma ilusão como uma afronta.

Neste aspecto vemos acadêmicos tendo crises de Classe Média Sofre por estarem ofendidos pro um povo que não obedeceu a seu comando títere e cisma em ter valores, gosto musical e fé diferente do que entende como ilustrado. É por isso que a média dos acadêmicos tende a apoiar candidatos e lógicas políticas que trabalhem com a mediação e com os limites e controles à mão, evitando rupturas, é por isso que vemos defensores de uma mudança de perspectiva etnocêntrica sobre grupos sociais ou etnias mantendo uma lógica e perspectiva etnocêntrica para com o que entende como "errado" ou "limitado".

O Ethos Acadêmico é um modo de entender o mundo que se liberta pela capacitação de observação do todo, cativa pela lógica hierarquizada, reformista e arrogante que torna acadêmicos como quase desejosos de um povo diferente do que têm, de uma lógica de comportamento SOCILA, de uma etiqueta social com punhos de renda e cuja percepção do povo foge à ciência mais reles e acaba por ser um apanhado de preconceitos misturados com rococós proto-científicos.

O Ethos acadêmico é fruto ainda da lógica burguesa de entender a sociedade, é um ethos construído não ontem, não anteontem e mantido desde o surgimento das universidades, mantido pelas revoluções burguesas e não combatido internamente pela maioria dos membros da academia.

O Ethos Acadêmico pensa o país e o mundo, mas impõe limites para a participação da construção do mundo e transformação do mundo baseados no entendimento do mérito acadêmico, da visão intelectualizada e formalizada como intelectualizada como visão dominante, ignorando em sua maioria os aspectos locais da construção do real e explicação deste. E mesmo quando não ignora as perspectivas nativas por um lado, as ignora por outro quando  o nativo não é pitoresco.

Precisamos da academia, precisamos da ciência, precisamos dos acadêmicos, pesquisadores, mas precisamos também ir além de retoques no mundo para evitar que as togas pareçam cada vez mais com mantos de nobres e menos com o macacão que se suja na terra pra construir um mundo novo.

Pensar é um ato político, mas precisa também ir além do discurso.