sexta-feira, 8 de abril de 2011

Diários do Sertão - Bahia

Nova Canudos
 Viajei recentemente a trabalho pelo Nordeste e resolvi fazer uma série pequena de relatos sobre a viagem e minha impressão após um retorno à região que beirou os quinze anos. Embora a Tragédia de Realengo no Rio de Janeiro tenha me abalado, acho por bem iniciar ao menos uma reflexão sobre a viagem por estado (antes a idéia era ser geral, falando de todos) e tentar exorcizar o capeta do ódio religioso e da loucura com o trabalho e a esperança que vi naquelas plagas.

 Resolvi começar pela boa terra, menos pelo fato inenarrável de ter sido lá o início da viagem e mais pelo impacto que visualmente, nitidamente, a transformação se deu naquele estado outrora dominado pela Família Malvadeza, vulgo Magalhães. Minha condição de oposição de esquerda ao Governo Lula acredito que pode  me dar o conforto necessário para efetuar esta análise simplória, dado que não sou o tocador de bumbo e ufanista nato que perambula pelas redes sociais e internet e que acha que Dom Sebastião Nasceu em Garanhuns, mas também não me deu uma lente de irracionalismo cachorro louco que ignore as mudanças que vi. A idéia aqui não é fazer uma tese, mas um relato de impressões, ou seja, um relato impressionista e fruto de observação direta e sem sintonia fina teórica da viagem

Parque Estadual de Canudos
 Primeiramente a Bahia parece que foi sacudida por um boom economico que não se vê por aí de grátis, embora Salvador tenha me parecido caída e nada atingida pelo bumbo, o interior é um mato de gente trabalhando, lojas abrindo, motos, carros, compra, venda, escolas bacanas, formigas que sairam de uma vida calhorda de tapação de buraco e fome que se via na década de 90, quando fui pela primeira vez à Bahia.

 Salvador pra mim foi exceção disso, onde me parece que a divisão ricos e pobres continua e ganha força, com avenidonas lindas, carros importados de um lado e pobreza, cara de fome e uma violência quase palpável e olha que sou carioca da gema, morador da Zona Oeste, que pra Globo é algo entre a savana africana e a palestina ocupada.

 Salvador é bonita pra cacilda, mas ao mesmo tempo mal cuidada, o que pra um carioca da Zona Oeste é assustador, porque achava que o auge era o descaso do Eduardo "Pereira" Paes com o que sai da zona sul e Barra. A história cheira na cidade, é linda mesmo, os predinhos, a sede do Arquivo, o Farol da Barra, o Pelourinho, tudo lindo demais, mas parece que a pobreza é mais nítida, talvez por ser menos escondida do que no Reino do Jardim Botanico.

 O que me impressionou foi um policial militar responder a uma pergunta do meu companheiro de viagem sobre onde podia estacionar nas imediações do farol da Barra com a seguinte pérola: "Pra vocês (Turistas) tudo pode, relaxe, não podemos multar, aqui o ônus é ser cidadão soteropolitano".

 De Salvador partimos pra Riachão de Jacuípe, pequena cidade com excelentes escolas e um formigueiro de motocicletas, comércio,etc, depois pra Pé de Serra, Serrinha (outra linda cidade, pólo regional, muito respeito pelo Patrimonio Cultural e outro formigueiro), Tucano e Caldas do Jorro (pólo turístico e outro formigueiro), Cícero Dantas, Jeremoabo, Euclides da Cunha, Uauá, Canudos, Nova Canudos e fiquei impressionado com o quanto as cidades que antes eram nadica de nada e paraíso de coronéis e miséria viraram outra coisa, viraram formigueiros e desenvolvimento, com escolas, hospitais, projetos de cultura, fomentos,etc... Uma das coisas que me impressionou foi a quantidade de preservação de patrimonio, talvez por fomento do estado que desconheço, e a quantidade de cultura emanando.  O parque estadual de Canudos é lindo, Serrinha uma beleza.

Uauá 
Foi a partir da chegada às proximidades de Paulo Afonso que o grau de crescimento caiu e pareceu que a Bahia privatizou para a CHESF as cidades ao redor das barragens por ela controladas. Rodellas dá pena, apesar de ter um centrinho com casas grandes de gente dita rica local, mas com um entorno de descaso, tanto com as estradas, bem cuidadas nos demais locais por onde passamos  que parecem estradas do Iraque após bombardeio, quanto com as pessoas, do que ali vivenciamos a velha Bahia, com gente colocando terra em buracos em troca de trocados.

Estranhei que o dito Sertão não é mais seco e que a beleza da geografia e das pessoas tenha aparecido, é inegável que algo aconteceu a partir da presença do governo central e do governo estadual, inclusive os relatos de moradores, desde donos de hotéis até garçons e transeuntes nos confirmaram isso.

 É preciso mais, tanto pra transformar em permanente a saída das pessoas da pobreza, quanto para evitar a poluição, que cresce junto com as cidades, tanto de rios quanto do ar, quanto para avançar em políticas locais e nacionais de avanços constantes para a esquerda, mas não é ignorando as transformações o melhor caminho para a crítica. Não dá pra aceitar que as transformações sejam apenas resultado de programas que podem ser revogados e que não se tornem estruturais com redução real da desigualdade na mesma velocidade que existe a redução da pobreza, com redução dos lucros constantes de bancos através dos juros da dívida,etc. Outra coisa preocupante é a continuidade de diversos programas que ajudaram na transformação com os cortes de orçamento, mas isso não apaga o que está ocorrendo agora, embora seja preciso que mantenhamos a atenção.

Na próxima parada viajaremos pro Pernambuco.

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